quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Ai se eu te pego: Um centavo nessa discussão

Não colocaria na minha playlist nenhuma música do Michel Teló, e antes que os fãs me acusem de preconceito e os intelectuais me carreguem nos braços, digo que fui criado ao som de Tonico e Tinoco, Trio parada dura, Sula Miranda e afins. Tenho o maior respeito por música, mesmo as que não me agradam. É uma questão de reconhecer qual o papel delas em determinadas cenas, eu nunca imaginei as minhas férias no campo ao som de João Gilberto. Nem as pessoas que moravam ali, pois não se identificariam com João Gilberto. Algo parecido acontece quando pessoas que não são paulistanas ouvem IRA!, Pobre Paulista, não há identificação. Ou o preconceito que sofre a banda Engenheiros do Havaí fora do Sul. E música é, em parte, identificação. 

Deixar sertanejo universitário fora da minha lista é apenas um fato ligado ao meu distanciamento com a música comercial. Realmente são poucas dessas músicas que conseguem a minha atenção. Pra mim, música é um pouco mais do que entretenimento, ela passa por questões culturais e estão diretamente ligadas ao seu tempo. O movimento punk não surgiria numa Inglaterra fora dos seus problemas sociais no final dos anos 70, e das duras mãos de Margaret Thatcher. Sem as reformas sociais promovidas por ela e seu neoliberalismo não haveria solo fértil para a revolta daqueles que não tinham futuro.

Nessa mesma época, as paradas eram inundadas por bandas como Duran Duran, e toda aquela sua alegria rosa. Algo dissonante do que vinha acontecendo na Inglaterra, como ter todo aquele amor e doçura em meio ao lixo acumulado nas ruas devido a uma greve dos lixeiros londrinos? Mesmo assim, havia essa mistura daquilo que surgia cheio de ideais e daquilo que era simplesmente comercial.

Antes de Michel Teló, tivemos uma lista enorme de hits grudentos. Não há mal algum nisso, a música pop é feita desses inúmeros hits. Quem não se lembra da "boquinha da garrafa"? A música popular brasileira (Sim, isso é realmente MPB) tem o direito de não ser política, não ser intelectual e fazer as pessoas dançarem. Fazer uma análise histórico-sociológica dessas letras, e culpá-las de não se encaixarem num determinado padrão de qualidade intelectual é reflexo da cultura da opinião baseada nas elites intelectuais, onde fora delas não há cultura. E como toda elite, eles se esquecem que cultura é todo um povo, e não um recorte de sociedade seguindo seus padrões.

"Ai se eu te pego" não é uma música política, em nada tem a ver com a ditadura de 64. Se você fizer uma análise da letra verá que ela é exatamente o que você entende. Tem um ritmo popular, sertanejo, acordes tocados de maneira correta, dançante. E claro, envolve sexismo na letra e tem uma coreografia sensual. Mas o mesmo não acontece nas novelas? Nas propagandas? Isso é um problema cultural, e não dessa música especificamente.

O que as pessoas tentam entender é porque essa música saiu do interior do país e tomou o mundo. Um caminho diferente da Macarena que tomou as paradas nos anos 90. Antes havia todo um processo para a música se tornar um sucesso mundial, e isso também envolvia muito dinheiro. Só grandes gravadoras podiam bancar um sucesso internacional.

O Nirvana, por exemplo, foi uma banda na qual uma grande gravadora apostou. Nevermind só se tornou um sucesso mundial com a injeção de muito dinheiro numa distribuição mundial. E essa segurança só se deu com o sucesso, anos antes, da dita música de universidade. Encabeçada pelas ótimas vendas de bandas como o REM.

Hoje as coisas funcionam um pouco diferente. Uma pequena produção e uma boa divulgação gastam menos recursos, plataformas livres de divulgação permitem que qualquer pessoa grave e divulgue seu trabalho. Produtos antes locais, podem agora se tornar mundiais se forem divulgados e caírem no gosto popular.

Quando esse texto sair, provavelmente "Ai se eu te pego" nem será tão famosa assim. Nós já vimos outros hits que vieram e foram, tão rápidos quanto a sua divulgação viral. Ainda lembram da "Banda mais bonita da cidade"?

Um número maior de pessoas divulgando seu trabalho diminui também a peneira que as separavam do sucesso. Antes, produtores rejeitavam, pois as oportunidades eram poucas e os talentos muitos. Agora, talento não é mais um pré-requisito para entrar no mundo globalizado da mídia. A quantidade de pessoas cantando em frente a uma WEBcam é impressionante, e na maioria das vezes hilária.

Mas só isso ainda não explica Michel Teló. Além da facilidade de divulgação mundial, ainda temos um fator favorável: o crescimento do Brasil frente ao mundo. Antes, éramos embalados no mesmo pacote dos países latino-americanos. Antes, éramos retratados como mais uma república das bananas, dançando salsa e rumba sem parar.

Nos últimos anos o crescimento do Brasil nos diferenciou no mercado internacional. As pessoas passaram a acreditar em nós como um produto particular, e com qualidade equivalente. Ao saber que um video é de determinado cantor brasileiro as pessoas passaram a não ter um rótulo generalizado latino e passaram a se interessar por aquilo que vem desse país em crescimento.

Muitos artistas brasileiros têm feito shows fora do país. Isso deixou de ser um luxo para os poucos consagrados e tem se tornado cada vez mais comum. Teló, é o primeiro grande hit dessa nova era. Não podemos discutir se a música é ruim, ou não. Se o sucesso dele é merecido ou não. Uma música de sucesso não pode ser prevista, se assim fosse, o mercado fonográfico seria muito agradecido. Pois saberia exatamente em quem investir, ao invés de gastar recursos com artistas que não seriam lucrativos. Música é negócio, pelo menos é assim que eles vêem.

O que eu vejo com "Ai se eu te pego" é apenas mais um hit comercial, de proporções mundiais, que tomará as paradas por algumas semanas. Após isso, um novo aparecerá e ninguém aqui vai questionar porque ele é sucesso. Questionar Michel Teló é questionar a nossa capacidade de criar produtos que podem ser vendidos mundialmente, pra mim, isso é normal. A capacidade do brasileiro é igual a de qualquer outro povo. E nosso momento econômico nos propicia isso.

Quanto a qualidade, bem, eu particularmente não gosto e procuro não ouvir. Mas gosto é algo questionável, a maioria das pessoas vêem a música como um entretenimento, uma busca coletiva de alienação. Quando eu quero me instruir não vou para a balada, isso é claro. O questionamento é se a todo momento precisamos estar envoltos em uma camada intelectual, e se em momento algum podemos escapar disso. Claro, a alienação permanente, algo constante na sociedade, também não traz benefícios. E viver em um estrato diferente é tão ruim para alienados quanto para intelectuais. Enfim, se não gosta, não preste atenção.

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